Sistemas de rastreamento ajudam usuários a descobrir o paradeiro do celular, mas a polícia não consegue resolver a maioria dos casos
SÃO PAULO – Danilo Góis comprou um iPhone 5C azul, seu primeiro smartphone. O valor do aparelho no Brasil se aproximava de R$ 2 mil. Teve de dividir em algumas vezes e ficou no vermelho. Era uma segunda-feira de fevereiro. Na sexta, rumo à faculdade, esbarrou em alguém em um terminal de ônibus de São Paulo. Minutos depois notou que o celular não estava mais no bolso. Já era tarde.
Pediu a desconhecidos para acessar seu serviço de nuvem e obter a localização do celular furtado. Estava desligado. À noite, já em casa, Danilo tentou uma última vez e um ponto indicava o celular se deslocando no Anhangabaú. Parou. Cracolândia. O técnico em alimentos mandou uma mensagem ameaçando o portador do seu iPhone. Passou o número do telefone da sua casa. O aparelho tocou às 2h30 na madrugada. “Você é o dono de um celular azul? Então vem buscar.”
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“Paramos alguns quarteirões antes, fomos a pé, eu e meu irmão. Aí um senhor surgiu de um prédio abandonado, entregou o celular dizendo que tinha comprado por R$ 10 e que não conseguia mexer”, conta. “Nem levei isso pra polícia. Fiquei tão nervoso na hora. Tinha acabado de comprar, não estava nem pago. Hoje acho que foi meio loucura.”
Essa “loucura” tem se tornado cada vez mais comum. A possibilidade de rastrear a localização do aparelho roubado, permitida por aplicativos dos três maiores sistemas operacionais (Android, iOS e Windows Phone), é vista como um perigoso atrativo às vítimas de roubos ou furtos de celulares. A descrença na eficiência da polícia, muitas vezes motivada pela própria instituição quando não se empenha em resolver o caso, ou a falsa ideia de que ela não é necessária, colaboram para o aumento desse tipo de prática.
Mariana Scarpari teve três celulares diferentes nos três últimos anos. Todos roubados. O último também sumiu em uma festa, mas na França. Conseguiu localizar o aparelho no último caso, mas a polícia alegou que roubos assim eram “comuns” e que se fossem atrás de todos os casos “não fariam mais nada”.
Impunidade. Segundo dados da pesquisa de vitimização em São Paulo, feita pelo Instituto de Ensino e Pesquisa, o Sniper, a participação do celular entre os objetos mais furtados e roubados praticamente triplicou em dez anos – saltando de 20,7% para 59,2%, entre 2003 e 2013. Em paralelo, roubos de dinheiro ficaram em segundo, caindo de 66,7% para 38,3%.
André Zanetic, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP, vê um processo cíclico nesse quadro. “Celulares são aparelhos pequenos com alto valor agregado, mas a polícia não vai atrás porque há muitos casos. A impunidade aumenta a descrença das vítimas e, por fim, encoraja os criminosos.”
Em março, casos de roubo em geral cresceram 33,9% em São Paulo, na comparação com o ano passado. Segundo a Secretaria de Segurança Pública, a polícia resolveu apenas cerca de 2% dos casos.
No caso da estudante de arquitetura Rázia Krug, a polícia foi acionada. Morando em São Paulo há dois anos, foi roubada duas vezes. Na última, após acessar o serviço Buscar meu iPhone (Find my iPhone), viu o aparelho perambulando pela Praça da Sé. Tirou fotos da tela, ligou no 190 e ouviu da polícia que “dariam uma passada para conferir”. Sem sucesso, sugeriu acompanhar os policiais no camburão. “Não podemos colocar em risco a sua integridade física”, foi a resposta.
O delegado Luis Tuckumantel, da 1ª Delegacia Seccional de São Paulo, defende que para a polícia não são suficientes apenas as informações oferecidas pelos aplicativos. De acordo com ele, ocorrem imprecisões de até 30 metros e a informação muitas vezes pode ser modificada pelo próprio criminoso.
Para Zanetic, também associado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a polícia deveria investigar todos os casos que são levados à delegacia e, caso receba apenas a localização, usá-la como indício, mesmo que o dado seja impreciso. “Essa informação é útil por si só. Por que não uma investigação naquele raio de ação? Por que não conferir a localização de todos os roubos e, percebendo um padrão, usar em uma investigação mais abrangente?”